Cientistas iniciam criação de DNA humano sintético do zero

Começou no Reino Unido um projeto que promete inaugurar uma nova fase na biotecnologia: a criação de DNA humano a partir do zero. A iniciativa, financiada com um aporte inicial de £ 10 milhões da Wellcome Trust, a maior organização de caridade médica do mundo, pretende construir blocos sintéticos do genoma humano, com aplicações médicas de longo alcance.

O trabalho representa um avanço além do que foi alcançado pelo Projeto Genoma Humano, concluído há 25 anos, que mapeou todos os genes humanos. Agora, o objetivo é ir além da leitura e partir para a construção: criar sequências de DNA humano de forma sintética, molécula por molécula, dentro de laboratórios, sem a intenção de gerar vida artificial.

Após o avanço alcançado pelo Projeto Genoma Humano, cientistas agora querem criar DNA do zero (Imagem: WinWin artlab / Shutterstock.com)

Projeto de DNA humano artificial representa novo horizonte para a medicina

Segundo os cientistas envolvidos, o principal foco é o desenvolvimento de terapias contra doenças incuráveis e o combate ao envelhecimento. “Estamos olhando para tratamentos que melhorem a vida das pessoas com o tempo, permitindo um envelhecimento com menos doenças”, afirmou o Dr. Julian Sale, do Laboratório de Biologia Molecular do MRC em Cambridge, à BBC.

Entre as possibilidades previstas está a criação de células resistentes a doenças, capazes de reconstituir órgãos danificados, como fígado e coração, ou mesmo reforçar o sistema imunológico. A equipe pretende inicialmente desenvolver blocos cada vez maiores de DNA, até atingir a criação de um cromossomo humano completo em laboratório.

DNA
Objetivo de cientistas é usar DNA sintético no combate a doenças e reconstrução de órgãos danificados (Imagem: FOTOGRIN / Shutterstock.com)

Riscos éticos e preocupações com uso indevido

  • Apesar do potencial para a medicina, o projeto enfrenta críticas de especialistas e ativistas que temem usos inadequados da tecnologia.
  • “A ciência pode ser reaproveitada para causar danos ou ser usada em guerras biológicas”, alertou a Dra. Pat Thomas, diretora da organização Beyond GM, à BBC.
  • Entre os receios estão a possibilidade de criação de armas biológicas, seres humanos modificados ou até criaturas com DNA humano.
  • O professor Bill Earnshaw, da Universidade de Edimburgo, que desenvolveu métodos para criar cromossomos humanos artificiais, afirmou: “O gênio saiu da garrafa. Mesmo com restrições, se alguém com os equipamentos certos decidir começar a sintetizar qualquer coisa, não há muito que possamos fazer para impedir”.

Reflexão ética e transparência

A Wellcome Trust afirma ter considerado cuidadosamente os riscos antes de aprovar o financiamento. De acordo com Dr. Tom Collins, responsável pela liberação do investimento, a decisão foi tomada diante da inevitabilidade do avanço tecnológico. “Perguntamos qual seria o custo da inação. Essa tecnologia será desenvolvida um dia; ao fazer isso agora, buscamos enfrentar as questões éticas de forma responsável e aberta”, declarou.

Para isso, um programa social paralelo acompanhará o desenvolvimento científico, coordenado pela socióloga Joy Zhang, da Universidade de Kent. A proposta é incluir a opinião pública e de especialistas no debate sobre os impactos sociais e morais do projeto. “Queremos entender como o público se relaciona com essa tecnologia, como ela pode beneficiá-lo e quais são suas dúvidas e preocupações”, explicou Zhang.

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O próximo passo na engenharia genética

O projeto, batizado de Synthetic Human Genome Project, será conduzido inteiramente em ambientes controlados, como tubos de ensaio e placas de cultura. Os pesquisadores deixam claro que não há planos para criar seres vivos sintéticos. Ainda assim, a iniciativa abre caminho para níveis inéditos de manipulação e entendimento sobre os sistemas vivos humanos.

Simbologia do DNA
Criação de DNA humano enfrenta desafios éticos, técnicos e jurídicos (Imagem: New Africa / Shutterstock.com)

Com a possibilidade de construir DNA do zero, cientistas poderão testar novas hipóteses sobre o funcionamento genético e buscar soluções para mutações responsáveis por doenças. “Hoje, só conseguimos fazer isso alterando o DNA já existente. A construção sintética nos permite testar o DNA em seu estado mais fundamental”, explicou o professor Matthew Hurles, diretor do Wellcome Sanger Institute.

O avanço levanta questionamentos complexos — de ordem técnica, ética e jurídica — sobre a propriedade de material genético sintético, seus possíveis usos e os limites da engenharia genética. A comunidade científica, por sua vez, afirma que a transparência e o debate público serão essenciais para que os benefícios se sobreponham aos riscos.


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