Imagine imprimir um coração ou rim sob medida para salvar vidas. Parece ficção científica, mas pode se tornar realidade mais cedo do que você pensa. A startup lituana Vital3D acredita que conseguirá “bioimprimir” órgãos humanos para transplantes dentro de dez anos.
“Imprimir órgãos para transplante é uma tarefa realmente desafiadora”, explica o CEO da startup, Vidmantas Šakalys, ao The Next Web. “Estamos a dez ou 15 anos disso, e como entidade comercial, precisamos ter produtos disponíveis no mercado antes disso.”
Por isso, antes de chegar aos órgãos complexos, a empresa mira em algo mais simples: regenerar pele de cachorros.
Como funciona a bioimpressão de órgãos na Vital3D
A Vital3D usa sistema de laser que deposita células vivas e biomateriais em padrões tridimensionais precisos. É como uma impressora 3D, mas ao invés de plástico, ela trabalha com células vivas mesmo.
O processo funciona assim:
- Laser direciona luz para bio-tinta fotossensível;
- Material endurece e se molda em estruturas complexas;
- Assim, organiza células e biomateriais em padrões tridimensionais que imitam sistemas biológicos.
A grande vantagem? Cada estrutura pode ser adaptada à anatomia de cada paciente.
VitalHeal: o primeiro curativo ‘bioimpresso’ para pets
Como toda startup, a Vital3D precisa de receita para financiar suas pesquisas mais ambiciosas. A solução foi criar o VitalHeal – o primeiro curativo “bioimpresso” da história para animais de estimação.

O VitalHeal é embebido com fatores de crescimento que aceleram a regeneração da pele. Na superfície, poros minúsculos – cerca de um quinto da largura de um fio de cabelo humano – permitem a circulação de ar enquanto bloqueiam bactérias.
Segundo a Vital3D, o curativo pode:
- Reduzir o tempo de cicatrização de 10-12 semanas para 4-6 semanas;
- Diminuir o risco de infecção de 30% para menos de 10%;
- Cortar pela metade o número de visitas ao veterinário (de 8 para 2-3);
- Reduzir pela metade o tempo cirúrgico.
Por que começar com cães? Cerca de metade dos cachorros com mais de dez anos são acometidos por câncer. Isso aumenta a demanda por cuidados eficazes com feridas. Além disso, o porte e nível de atividade dos cães aumentam o risco de ferimentos.
Testes e preço
Após resultados positivos em ratos, os testes em cães começarão entre junho e setembro de 2025 em clínicas na Lituânia e no Reino Unido. Se tudo der certo, um curativo não biodegradável será lançado na Europa em 2026, seguido por uma versão biodegradável.

Inicialmente, a tecnologia não será barata. O preço de varejo será 300 euros (cerca de R$ 1,9 mil), enquanto no atacado vai sair por 150 euros (R$ 960).
Vai ser caro? Sim. Mas a empresa afirma que pode reduzir os custos totais de tratamento para os donos de pets de 3 mil euros (R$ 19,2 mil) para 1,5 mil euros (R$ 9,6 mil). Além disso, a produção em escala deve tornar abaixar os preços no futuro.
O futuro da startup de ‘bioimpressão’: da veterinária para humanos
O próximo passo será adaptar a tecnologia para uso humano. O foco inicial será o tratamento de feridas em pessoas com diabetes – 25% delas sofrem com cicatrização prejudicada.
Versões futuras poderão atender vítimas de queimaduras, soldados feridos e outros pacientes que necessitem de restauração avançada da pele.

A Vital3D não para por aí. Em parceria com o Instituto Nacional do Câncer da Lituânia, a startup desenvolve organoides – versões miniaturizadas de órgãos – para testes de medicamentos contra o câncer.
Além disso, existe o projeto para desenvolver stents bioimpressos, que mostram bons resultados em testes iniciais com animais.
Leia mais:
Obstáculos e potencial
Ainda há grandes obstáculos científicos a serem superados antes de imprimir órgãos completos. Entre eles, estão:
- Vascularização: formar vasos sanguíneos em redes intrincadas é extremamente complexo;
- Diversidade celular: muitos órgãos têm diversos tipos de células que precisam trabalhar em harmonia.
“Primeiro de tudo, queremos resolver a vascularização”, explica Šakalys. “Depois, vamos avançar para a diferenciação celular.”

Se bem-sucedida, a Vital3D pode ajudar a resolver um problema global grave. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), menos de 10% dos pacientes que precisam de transplante recebem um órgão por ano.
Šakalys enxerga a bioimpressão não só como forma de criar órgãos, mas como o avanço rumo a uma nova era da medicina personalizada.
A medicina do futuro pode estar mais próxima do que imaginamos. E está começando com nossos melhores amigos de quatro patas.