Em agosto de 2012, cientistas do Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN), na Suíça, bateram um recorde impressionante: criaram a temperatura artificial mais alta já registrada na Terra. Para se ter uma ideia, o núcleo solar chega a 15 milhões de graus Celsius. Naquele experimento, a marca alcançada foi de cinco trilhões de graus (sim, mais de 300 mil vezes mais quente que o Sol) – entrando para o Guinness, famoso livro de recordes mundiais.
O feito aconteceu dentro do Grande Colisor de Hádrons (LHC), o maior acelerador de partículas do mundo. Trata-se de um túnel circular com 27 quilômetros de comprimento, enterrado sob a fronteira entre a Suíça e a França. Ali, partículas são aceleradas até velocidades próximas à da luz e depois colidem com força brutal.
De acordo com a PBS, emissora de TV educativa dos EUA, essas colisões são feitas com íons de chumbo, que são átomos pesados, cheios de prótons e nêutrons. Quanto maior a massa da partícula, maior a energia gerada na colisão. E quanto mais energia, mais calor. O resultado foi uma miniatura do que se acredita ter sido o estado do Universo nos primeiros microssegundos após o Big Bang.
“Bola de fogo de quarks e glúons”
O fenômeno gerado recebeu um nome curioso: “bola de fogo de quarks e glúons”. Em linguagem simples, é uma sopa de partículas fundamentais que formam tudo o que existe hoje. Segundo os cientistas, recriar esse estado da matéria ajuda a entender como o Universo evoluiu nos seus primeiros instantes.
E como se mede uma temperatura tão absurda? Não dá para enfiar um termômetro ali, claro. Os físicos analisam os efeitos das colisões: o tipo de partículas geradas, como elas se espalham e em que velocidades saem dos detectores. Tudo vira conta de física avançada.

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Em um comunicado de 2020, o professor Urs Wiedemann, teórico do CERN e especialista em plasma de quarks e glúons, comparou o processo a ouvir instrumentos musicais. Mesmo tocando a mesma nota, cada um tem um conjunto único de harmônicos, que diferencia o som. No caso do LHC, esses “harmônicos” são as ondulações que surgem no plasma de quarks e glúons logo após as colisões.
Essas “ondas sonoras” subatômicas permitem medir propriedades como temperatura, densidade de energia e viscosidade. Aliás, o plasma gerado tem uma resistência ao atrito tão baixa que é considerado o fluido mais perfeito já conhecido.
Não dá para ser “mais perfeito do que perfeito”
O curioso é que o recorde do CERN não foi o primeiro nessa corrida de temperaturas extremas. Dois meses antes, em junho de 2012, o Colisor Relativístico de Íons Pesados (RHIC), um laboratório em Nova York, também havia criado uma temperatura impressionante: 4 trilhões de graus Celsius.

Mas a festa dos EUA durou pouco. Quando o CERN confirmou seus resultados em agosto, a liderança mudou de mãos. A diferença é que os europeus demoraram dois anos para confirmar os dados, por causa da complexidade das medições.
De qualquer forma, ambos os feitos são reconhecidos. “Embora as colisões do LHC liberem 25 vezes mais energia do que as colisões do RHIC, não vemos muita diferença no processo de formação de gotículas”, disse Julia Velkovska, professora de física da Universidade Vanderbilt, no estado norte-americano do Tennessee e membro da equipe do LHC, em 2015. “Depois de atingir o limite, adicionar mais energia não parece ter muito efeito. Eu acho que você não pode ficar mais perfeito do que perfeito!”.