Todas as sextas-feiras, ao vivo, a partir das 21h (pelo horário de Brasília), vai ao ar o Programa Olhar Espacial, no canal do Olhar Digital no YouTube. O episódio da última sexta-feira (23) (que você confere aqui) repercutiu e comentou os possíveis desafios e evoluções pelos quais a espécie humana passaria para poder conquistar Marte.
A professora e astrobióloga Mírian Forancelli Pacheco explicou durante o programa as adaptações que o Homo sapiens teria de passar para poder viver no Planeta Vermelho. Pacheco é mestre em Arqueologia, doutora em Geociências e pós-doutora em Física Nuclear pela Universidade de São Paulo (USP). Desde 2013, é docente na Universidade de São Carlos (UFSCar) em Sorocaba e Chefe do Laboratório de Paleobiologia e Astrobiologia na mesma instituição.
Durante a entrevista, o astrônomo e apresentador Marcelo Zurita conversou a professora sobre como a humanidade poderia colonizar o território marciano e qual o futuro da espécie em outro astro. “A conquista de Marte — um sonho que tem impulsionado a humanidade por décadas — está cada vez mais próxima de se tornar realidade”, disse Zurita.
Como conquistar Marte?
No estágio atual, a humanidade terá de desenvolver uma forma mais viável e econômica de chegar a Marte, segundo a professora. Pacheco defende que os seres humanos deveriam começar por bases lunares, pois gastariam menos combustível saindo da Lua do que da Terra. A velocidade de escape no satélite terrestre é menor, o que facilitaria o lançamento dos foguetes.
Ao se chegar no Planeta Vermelho, os raios ultravioleta (UV) e a atmosfera rarefeita seriam os primeiros desafios. No passado, Marte perdeu seu campo magnético e tem menos proteção à radiação UV – que é danosa aos seres humanos, podendo causar mutações e consequentemente doenças como o câncer.
“Teríamos que fazer postos semipermanentes para que os seres humanos pudessem se estabelecer. Essas bases teriam de ter ar respirável no interior e proteção contra radiação UV”, explicou Pacheco.
A alimentação viria logo em seguida. O Planeta Vermelho está distante do Sol, recebendo apenas 44% da energia solar que a Terra recebe, segundo a pesquisadora. O solo também é impróprio, o que leva a duas alternativas: a aquaponia – sistema de plantação que integra peixes e plantas numa estrutura aquática – ou a desintoxicação do regolito marciano.
“A gente precisa transformar o solo marciano em algo mais parecido com o da Terra. A terraformação a longo prazo seria uma possibilidade real”, comentou a professora
Pacheco vê o processo de terraformação – a alteração de propriedades como a atmosfera, temperatura, topografia e ecologia, do Planeta Vermelho para adaptá-lo aos seres humanos – como algo possível. Porém, ela explica que a tecnologia necessária é algo para gerações futuras, não sendo realizável nas próximas décadas ou séculos.

Espécie humana sofreria adaptações?
Alguns cientistas acreditam que a humanidade poderia se adaptar e evoluir em Marte. O Olhar Digital noticiou a entrevista de Scott Solomon, professor de biociências na Universidade Rice, nos EUA, em que ele apresenta o Homo martianus: uma possível evolução do H. sapiens para o ambiente marciano.
Durante o Olhar Espacial, Pacheco e Zurita comentaram sobre a nova hipótese. A professora explicou que Solomon considera uma evolução rápida para o grupo de humanos que chegaria em Marte. As adaptações ocorreriam em algumas centenas de anos. “Uma população pequena com a seleção natural agindo pode sofrer transformações muito rápidas”, comentou a astrobióloga.
Pacheco disse que a densidade óssea aumentaria, pois os seres humanos precisariam ser mais resistentes. “A nossa densidade óssea tenderia a evoluir para densidades maiores, por conta da relação com a gravidade e da gestação humana. Precisaríamos de uma pélvis mais resistente para o trabalho de parto”, comentou a professora.
A cor de pele dos seres humanos também se alteraria. A cientista defende que haveria um aumento da produção de eumelanina, o pigmento que causa o escurecimento da pele e protege o material genético humano dos raios UV.
Se o caso for extremo, um novo pigmento apareceria. “De acordo com Solomon, poderia surgir por mutação um novo tipo de pigmento que seria mais eficiente em proteger nosso material genético dos raios UV. A nossa cor poderia ser outra”, disse Pacheco.

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Tecnologia: um fator fundamental
A professora criticou a falta de consideração da tecnologia como influência na evolução em Marte proposta por Solomon. Os postos marcianos poderiam atenuar as condições ambientais e o processo evolutivo ocorreria de forma diferente. “Nossa evolução está entrelaçada com a tecnologia”, defendeu Pacheco.
Ao desconsiderar fatores como sociedade e tecnologia, o professor norte-americano deixou de lado aspectos fundamentais da evolução, segundo a astrobióloga. Ela explicou que o desenvolvimento tecnológico é também uma forma de evolução.
“No caso da nossa espécie, temos coevoluido muito com a tecnologia. Se pensarmos bem profundamente, ela não deixa de ser biológica porque é produzida pelo ser humano. Assim como os castores constroem barragens, a tecnologia é um produto da nossa espécie”, disse Pacheco.
A professora definiu o conceito de Solomon como um pensamento arrojado e otimista, mas que as bases cientificas ainda precisam de testes na espécie humana, um dilema ético a ser debatido. Mesmo assim, Pacheco afirmou que não deixa de sonhar com a conquista de Marte e os desdobramentos sociais e científicos que a realização desse sonho podem trazer para a humanidade.