Quem desafia, perde: livro mostra como ‘pai’ do ChatGPT é implacável

“Eles desafiaram Altman, e Altman venceu.” É assim que a jornalista Karen Hao resume o drama na trajetória da OpenAI. Ela passou quase dois anos mergulhada na história do CEO Sam Altman e da sua startup, desenvolvedora do ChatGPT, para escrever o livro Empire of AI.

Em tradução livre, o título e subtítulo do livro são “Império da IA: Por dentro da corrida imprudente pela dominação total“. Lançada na terça-feira (20), a obra explora a ascensão da OpenAI e as implicações da corrida pela inteligência artificial (IA). Por ora, o livro não foi publicado em português.

Sam Altman é intocável? Autora de livro sobre OpenAI fala do CEO

Após o drama da demissão e readmissão ao cargo de CEO da OpenAI, em 2023, Sam Altman se tornou intocável? “Certamente ele consolidou seu poder“, diz Karen, em entrevista ao jornal The Guardian. Para a jornalista, o conselho atual está “muito mais alinhado com os interesses dele [Altman]”.

Montagem com fotos de Sam Altman, CEO da OpenAI, e o bilionário Elon Musk
Sam Altman, CEO da OpenAI, e o bilionário Elon Musk (Imagem: jamesonwu1972/Frederic Legrand – COMEO/Shutterstock)

O grupo de personagens na história da OpenAI tem mentes brilhantes e, muitas vezes, excêntricas. Afinal, estamos falando de uma startup cofundada por Elon Musk. No centro dela, está o carismático Altman, outro cofundador e atual CEO.

Ao longo dos quase dois anos que Karen levou para escrever seu livro, Altman parece ter superado seus opositores. E anunciou planos para angariar US$ 7 trilhões (quase R$ 40 trilhões) em investimentos. A autora descreve Altman como “um talento de uma geração” na “arrecadação de fundos”.

“Ele convence as pessoas a cederem poder a ele, não o toma à força”, diz Karen. “A razão pela qual consegue fazer isso é porque é incrivelmente bom em entender o que as pessoas querem e o que as motiva.”

Sam Altman: carismático e implacável

A jornalista vai além: “É também por isso que ele conseguiu fazer algo que a maioria das pessoas não conseguiria, que é fazer o público acreditar na ideia de que ele está fazendo algo profundamente bom para a sociedade – tempo suficiente para conseguir se safar.”

Celular com página de Sam Altman, CEO da OpenAI, no Twitter aberta, colocado na frente de tela exibindo logotipo da OpenAI
Autora de livro sobre OpenAI descreve Sam Altman como “um talento de uma geração” na “arrecadação de fundos” (Imagem: DIA TV/Shutterstock)

Dentro da OpenAI, “todas as pessoas que já entraram em conflito com ele sobre sua visão de desenvolvimento da IA saíram”, aponta a jornalista. “Musk saiu, Dario Amodei saiu, Sutskever saiu [eles foram os primeiros líderes da OpenAI]”.

No fim das contas, eles tinham uma ideia diferente de como a IA deveria ser desenvolvida. Eles desafiaram Altman, e Altman venceu.

Karen Hao, jornalista e autora do livro Empire of AI, em entrevista ao jornal The Guardian

‘Precisamos ser céticos’

A irmã de Altman, Annie, “é um estudo de caso perfeito de por que precisamos ser céticos em relação ao que Sam Altman diz sobre os benefícios da IA“, diz a autora do livro.

Altman defende que a IA vai resolver a pobreza e melhorar o sistema de saúde. Mas Annie, que vive na pobreza e tem problemas de saúde, não viu nenhum desses benefícios, aponta Karen.

Janela de nova conversa no ChatGPT com destaque para botão Deep Research
Altman defende que a IA vai resolver a pobreza e melhorar o sistema de saúde, mas uma pessoa próxima a ele serve como estudo de caso contra isso, aponta a autora (Imagem: aileenchik/Shutterstock)

Dose de contexto:

  • Em 2021, Annie alegou que Altman havia abusado sexualmente dela quando criança (ele é nove anos mais velho);
  • Em janeiro de 2025, ela o processou;
  • Em comunicado divulgado por Altman, sua mãe e seus dois irmãos (o pai morreu em 2018), as alegações foram descritas como “totalmente falsas”.

A OpenAI tinha concordado em conversar com Karen para o seu livro. Mas desistiu após descobrir que ela também conversava com Annie.

“Por que um representante da empresa tornou isso sua principal preocupação?”, questiona a jornalista. “Isso me mostrou o quanto Sam, o homem, é importante para a empresa.”

Lançamento do ChatGPT afetou (muito) o desenvolvimento de IA, segundo autora

Quando o assunto é IA, dá para organizar a história em a.C e d.C – antes do ChatGPT e depois do ChatGPT.

Durante parte do período a.C, Karen escreveu para a revista MIT Technology Review. Daí seu fascínio por IA, inclusive. “Eu passava praticamente todo o meu tempo conversando com pesquisadores dentro de empresas que operavam em ambientes semelhantes ao acadêmico” (leia-se: sem objetivos comerciais).

Poucos dias após o lançamento do ChatGPT, no final de 2022, a plataforma já tinha um milhão de usuários (Imagem: Ju Jae-young/Shutterstock)

Além da “grande diversidade de pesquisas acontecendo”, surgia “uma linha de pesquisa sobre IA e seu impacto na sociedade”. Nesta época (por volta de 2016), se discutia, por exemplo:

  • Quais são os danos?
  • Quais são os vieses incorporados nos modelos que podem levar a uma discriminação generalizada e a questões de direitos civis?

Era mais ou menos aí que o mundo da IA e o debate estavam antes de serem desviados pelo ChatGPT.

Karen Hao, jornalista e autora do livro Empire of AI, em entrevista ao jornal The Guardian

Poucos dias após o lançamento do ChatGPT, no final de 2022, a plataforma já tinha um milhão de usuários. Em poucos meses, atingiu 100 milhões de usuários. E se tornou o aplicativo de consumo com crescimento mais rápido da história.

Chip da OpenAI
Sucesso do ChatGPT ofuscou debates saudáveis sobre IA no mainstream, diz jornalista que escreveu livro sobre a OpenAI (Imagem: DesignRage/Shutterstock)

A jornalista teve a impressão de que o sucesso do ChatGPT ofuscou debates saudáveis sobre IA, ao menos no mainstream. “As pessoas simplesmente compraram o que a OpenAI e outras empresas entregavam de bandeja em termos de narrativa”, diz a autora.

  • Que narrativa? “Isso vai curar o câncer, isso vai resolver a crise climática, todas essas coisas utópicas com as quais nem se pode sonhar”, aponta Karen.

Então, a jornalista começou a trabalhar no que se tornaria seu livro, analisando a história da OpenAI e de seus concorrentes. “Só quando você tem esse contexto é que pode começar a entender que o que essas empresas dizem não deve ser aceito ao pé da letra.”

Leia mais:

Império da IA

A premissa do livro de Karen Hao é: os gigantes da IA comandam um império. Mas a história nos mostra que impérios não só podem cair como, de fato, caem. E a autora vê cada elo do supply chain como um possível ponto de resistência.

Logos de inteligências artificiais em um smartphone
A premissa do livro de Karen Hao é: os gigantes da IA comandam um império (Imagem: Tada Images/Shutterstock)

Artistas e escritores, por exemplo, têm reagido contra o uso de suas obras para treinar modelos de IA generativa. Aplicar leis de privacidade de dados “também é uma forma de conter o império”, assim como forçar as empresas a serem transparentes quanto ao impacto ambiental dessas plataformas.

  • O impacto ambiental do boom da IA generativa vai desde o consumo de energia até onde e como os minerais necessários para o hardware são extraídos.

As empresas de tecnologia “querem que suas ferramentas pareçam mágicas”, aponta a autora. Mas ela gostaria de ver mais educação pública para as pessoas perceberem que cada comando dado numa plataforma de IA consome recursos e energia.

Pressionar esses e outros pontos “pode nos levar, pouco a pouco, de volta a um modelo mais democrático de governança da IA“, diz a autora.


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