IA do INSS erra e causa recusas injustas de benefícios

O uso de ferramentas baseadas em inteligência artificial (IA) no Brasil tem sido cada vez mais comum em diversas áreas, incluindo o sistema previdenciário. O Meu INSS, aplicativo criado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), foi implementado em 2018 com o objetivo de agilizar o processo de concessão de benefícios, como aposentadoria e auxílio-doença, por meio de uma análise automatizada. Recentemente, o INSS passou a usar IA no processo.

Contudo, o sistema tem gerado problemas para muitos brasileiros, principalmente para trabalhadores rurais e aqueles com pouca familiaridade com tecnologia, como mostra uma reportagem do Rest of World.

A publicação norte-americana sem fins lucrativos contou o caso de Josélia de Brito, uma ex-trabalhadora rural do nordeste brasileiro, viveu na pele os desafios impostos pelo sistema de IA. Ao solicitar a aposentadoria através do app, Josélia teve seu pedido negado de forma automática devido a um erro de identificação, sendo registrada como homem no sistema.

Esse tipo de falha tem se tornado comum para trabalhadores com pouco acesso a recursos tecnológicos, que enfrentam dificuldades para corrigir as inconsistências, já que o sistema não oferece alternativas eficazes de revisão.

A implementação da IA no Meu INSS

  • O Meu INSS foi desenvolvido com o intuito de reduzir a burocracia e acelerar a concessão de benefícios.
  • Desde sua introdução, a ferramenta tem sido utilizada para processar um grande volume de solicitações, com a meta do governo de que até 2025, 55% das solicitações sejam analisadas de forma automatizada.
  • Em muitos casos, o sistema tem conseguido acelerar o processamento de pedidos simples.
  • Porém, isso também tem levado à recusa automática de pedidos com pequenos erros ou inconsistências, o que afeta especialmente aqueles em áreas remotas do país.
  • A introdução da IA no processo foi vista inicialmente como uma inovação positiva, com a promessa de tornar o sistema mais ágil.
  • No entanto, como destacam especialistas, o uso de tecnologia sem uma análise crítica e sem a capacitação adequada dos cidadãos tem resultado em exclusão digital.
  • Josélia de Brito, por exemplo, que sofre de doenças crônicas e precisa de benefícios previdenciários, relatou sua frustração ao ver seus pedidos recusados repetidamente, mesmo tendo toda a documentação necessária.
  • Para ela, o processo de solicitar benefícios tornou-se humilhante e cada erro no sistema parecia resultar em uma negação sem explicações claras.
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A IA do app Meu INSS agiliza a vida de muita gente, mas pode ser um problema para outros (Imagem: rafastockbr / Shutterstock.com)

O impacto sobre trabalhadores rurais

A implementação de IA no Meu INSS tem se mostrado especialmente problemática para trabalhadores rurais, que muitas vezes não possuem acesso a internet de qualidade e enfrentam dificuldades de alfabetização digital.

Dados indicam que a taxa de analfabetismo em áreas rurais do Brasil é três vezes maior do que nas zonas urbanas, o que aumenta as dificuldades desses trabalhadores ao interagir com sistemas digitais. Além disso, muitos casos complexos, como aqueles envolvendo propriedades rurais de difícil documentação, acabam sendo rejeitados pela IA, que não consegue processar essas solicitações com precisão.

Especialistas afirmam que, apesar dos esforços para agilizar o processo, a automação não está preparada para lidar com as particularidades do trabalho rural. Edjane Rodrigues, secretária da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, destacou ao Rest of World que esses casos deveriam ser analisados por seres humanos, já que a legislação social prevê uma série de nuances que a IA não consegue interpretar corretamente.

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Trabalhadores rurais podem ser prejudicados pelo modelo atual de revisão de solicitações (Imagem: elpidio costa junior / iStock)

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A tecnologia pode ser uma solução ou um obstáculo?

Embora o governo brasileiro tenha investido milhões para aprimorar o sistema, com o objetivo de tornar os serviços mais eficientes, a dependência crescente de inteligência artificial também gerou receios. No início de 2025, a empresa responsável pela criação do app, a Dataprev, anunciou um investimento de aproximadamente 10,5 milhões de dólares para melhorar as capacidades de análise de dados e detecção de fraudes do Meu INSS.

Apesar das críticas, o Meu INSS continua sendo amplamente utilizado no Brasil, com 84 milhões de acessos mensais. No entanto, especialistas alertam que um aumento da dependência da tecnologia pode resultar em ineficiência e exclusão para aqueles mais vulneráveis, que não têm os recursos ou o conhecimento para navegar por sistemas automatizados.

Em um cenário em que a digitalização das funções públicas é vista como uma solução para aumentar a eficiência, surge a necessidade de um equilíbrio entre a automatização e a análise humana. Isso é especialmente importante em casos onde o processo de concessão de benefícios envolve elementos que não podem ser reduzidos a simples critérios algorítmicos. Sem esse equilíbrio, a inovação pode se transformar em um obstáculo para os cidadãos que mais necessitam de assistência.


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